Ritual autoritário, do cotidiano hostil das ruas. Em oposição à 'cordialidade do brasileiro, o 'você sabe...' representa o 'esqueleto hierarquizante de nossa sociedade' (DA MATTA, 1981, p.142). esqueleto como algo escondido, sob a carne e a pele, e no entanto é fundamental na composição do corpo.
O ritual apresenta uma oposição entre um dado individualizante, visível e superficial, sendo elemento igualitário o discurso
oficial e legítimo, com um componente pessoal e hierárquico, profundo e menos visível, mas decisivo e eficaz posto que resolve o conflito e restaura a paz hierárquica ameaçada. Ou seja, é um ritual que lembra ao perturbador da paz hierárquica, que acredita no princípio da igualdade, qual é o 'seu lugar'. É uma punição por tentar fazer cumprir a lei. 'Tememos esbarrar a todo momento com o filho do rei, senão com o próprio rei'.
No caso das leis, seguimos a vertente burocrática, universalizante e igualitária do sistema. Mas na prática, seguimos o código da moralidade pessoal, tomando a vertente do 'jeitinho', da malandragem e da solidariedade como eixo de ação. No primeiro caso, tratamos o indivíduo, um sujeito abstrato; no segundo caso temos a pessoa, que merece um tratamento diferencial.
A lei, sendo algo abstrato, tem como ponto de partida a igualdade e provavelmente também como ponto de chegada. Mas no conflito entraria o componente das relações pessoais, do 'capital', da influência.
O poder de diminuir os conflitos conferido ao judiciário, assumiria então um caráter informal, sem burocracia e rápido, através da 'carteirada', do jeitinho, da ameaça. O 'você sabe...' coloca a pessoa no lugar do indivíduo.
O brasileiro teria assim um comportamento diverso daquele estimulado pelas instituições sociais, como o próprio Estado.