segunda-feira, 28 de julho de 2008

Sobre a alma autoritária: "carnavais, malandros e heróis"

"Você sabe com quem está falando?"
Ritual autoritário, do cotidiano hostil das ruas. Em oposição à 'cordialidade do brasileiro, o 'você sabe...' representa o 'esqueleto hierarquizante de nossa sociedade' (DA MATTA, 1981, p.142). esqueleto como algo escondido, sob a carne e a pele, e no entanto é fundamental na composição do corpo.
O ritual apresenta uma oposição entre um dado individualizante, visível e superficial, sendo elemento igualitário o discurso
oficial e legítimo, com um componente pessoal e hierárquico, profundo e menos visível, mas decisivo e eficaz posto que resolve o conflito e restaura a paz hierárquica ameaçada. Ou seja, é um ritual que lembra ao perturbador da paz hierárquica, que acredita no princípio da igualdade, qual é o 'seu lugar'. É uma punição por tentar fazer cumprir a lei. 'Tememos esbarrar a todo momento com o filho do rei, senão com o próprio rei'.
No caso das leis, seguimos a vertente burocrática, universalizante e igualitária do sistema. Mas na prática, seguimos o código da moralidade pessoal, tomando a vertente do 'jeitinho', da malandragem e da solidariedade como eixo de ação. No primeiro caso, tratamos o indivíduo, um sujeito abstrato; no segundo caso temos a pessoa, que merece um tratamento diferencial.
A lei, sendo algo abstrato, tem como ponto de partida a igualdade e provavelmente também como ponto de chegada. Mas no conflito entraria o componente das relações pessoais, do 'capital', da influência.
O poder de diminuir os conflitos conferido ao judiciário, assumiria então um caráter informal, sem burocracia e rápido, através da 'carteirada', do jeitinho, da ameaça. O 'você sabe...' coloca a pessoa no lugar do indivíduo.
O brasileiro teria assim um comportamento diverso daquele estimulado pelas instituições sociais, como o próprio Estado.

3 comentários:

Anônimo disse...

Carnavais Malandros e Heróis colocou Roberta Damatta como o autor mais influente nos campos das Ciências Sociais brasileiras nos últimos 30 anos , ou seja, desde a publicação desta obra. Atavés de sua sociologia dual ele procura demonstrar como o Brasil seria estruturado por um essencialismo fundamental, pois aqui as "leis" de mercado e Estado teriam barreiras para sua ação. O par antípoda indivíduo/pessoa demonstraria como em nosso país as regras dessas instituições não valeriam , pois as relações de compadrio, amizade, o jeitinho brasileiro, seriam os grandes estruturadores de nossas relações sociais. Com essa tese, Damatta consegue um poder de convencimento no seio de boa parte da academia e avassaladoramento no senso comum, pois ratifica seus preconceitos fundamentais. Sua socilogia dual estrutura-se em relações face-a-face, como se apenas essas fossem suficientes para a explicação das ações e interações sociais. Esse tipo de sociologio subjetivista, fortemante praticada nos Estados Unidos, fruto da Escola de Chigado e da Escola Racional, simplesmente dão um nós conceitual quando vão analisar relações macro-sociológicas. Pierre Bourdieu, no seu fundamental La Distinción, demonstrar como elemento invisíveis funcionavam como fatores criadores de distinções sociais no país marcado e propagado pela meritocracia. Por que o Brasil seria marcado pela essencialismo de Da Matta? Norbert Elias em seu Processo Civilizatório, demonstra sobejamente como o Estado atua no profunda de cada pessoa, dizendo como devemos agir, sentir...!!! Ou seja, não existe barreira para a sua atuação como pensa e argumenta Damatta. Weber, por sua vez, demostra como o mercado enquando um "artefato pronto" aje de maneira intensiva na criação de um tipo humano de acordo com os seus imperativos. Tal análise no caso Brasileiro pode ser vista na fundamental obra de Florestan Fernande: A Revolução Burguesa no Brasil. Ou no clássico Sobrados e Mucambos de Freyre. Além disso tudo, para Matta nossa modernização seria superficial, epdérmica. Ora, as transformações iniciadas com a abertura dos portos e consolidadas com a revolução de 1930, que é analisada sobejamente por Luiz Werneck Vianna demonstram o caminho feito pela país rumo à modernidade. Que possuímos fortes relações pessoais é inegável. Todavia, afirmar que somos personalistas como argumenta Damatta, assumindo todas as suas consequências constitui, no meu entender, um grande equívoco para a construção de uma análise científica da realidade brasileira perfeitamente afastada dos preconceitos do senso comum.José Maurício Domingues com o seu conceito de subjetividade coletiva nos fornece um bom caminho alternativa ao essencialismo p-seudo teórico de Damatta. Além disso, as proposições de Damatta funcionam como uma grande ideologia de nossa brasilidade, como já havia na década de 1930 do século passado na tese do Homem cordial de Sérgio Buarque e na tese da democracia racial(ou social como preferia o autor) de Gilberto Freyre. Ainda assim, a obra de Damatta nos deixa um importante ensinamento implícito e inintencional: precisamos produzir teoria da periferia para a periferia, mas que possoa abarcar todas as nossas complexidades e indiossincracias e possa sumplantar p-seudo teorias como a sociologia dual de Roberto Damatta.

Rodrigo Rosselini disse...

Bom comentário! Maior que o próprio post!!!

Marcos disse...

Roberto Damatta merece!!